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“Viver em Berlim como artista independente tem sido essencial”, revela She Knows, com série de lançamentos expressivos

She Knows é formado pelo brasileiro ex-Dead Fish Marcel Dadalto e cantora espanhola Teresa Tomás

  • Redação
  • 25 September 2023

Vocal suave, mas poderoso que se combina com sintetizadores, essa é uma das características presentes no projeto berlinense She Knows.

Formado em 2014 pela cantora, compositora e produtora espanhola Teresa Tomás e pelo músico, compositor e produtor brasileiro Marcel Dadalto (conhecido no país por ter sido membro das bandas Dead Fish e Zémaria), a dupla lançou o EP 'Extraordinary', pela conceituada gravadora alemã Bar 25 Music. Ouça aqui.

Carregando quatro faixas ("Extraordinary", "Twisted and Strange" e "Something to Save", além de um remix desta assinado pelo DJ e produtor ucraniano The Organism, conhecido por sua versatilidade e imprevisibilidade), o disco é expressa as particularidades sonoras de She Knows: música eletrônica orgânica, profunda, cadenciada e marcante, com requintes jazzísticos, texturas ricas e melodias poderosas.

Em agosto, She Knows lançou um novo EP, “Elements” chegou pela gravadora francesa AZZUR. O lançamento também inclui duas revisões maravilhosas do crescente astro espanhol Adrian Roman. Ouça aqui.

Mais detalhes dos lançamentos e da trajetória de Teresa e Marcel você confere na entrevista logo abaixo.

Q+A: She Knows

Vocês têm trajetórias e bagagens bem diferentes na música. Como seus destinos se cruzaram em Berlim, e por que decidiram formar esse projeto?

Marcel: Eu havia passado mais de uma década fazendo turnês anuais de 2 a 3 meses de duração pela Europa com a Zémaria. Em meio a estas turnês, quando tocamos em Berlim pela primeira vez em 2006, fiquei muito impressionado com a energia artística que havia na cidade. Foi quando conheci o Panorama, Bar 25, Tacheles, Club der Visionäre, Golden Gate, etc.

Aquilo me influenciou muito musicalmente e quando retornei ao Brasil fiz um projeto paralelo ao Zémaria, chamado Monk Ponk. O projeto rendeu 2 EPs lançados em Vinil por selos de Berlim. Um no selo do Savas Pascalidis e outro no selo do DJ Boris, residente do Berghain. Aquilo me abriu muitas portas e todo ano quando retornava à Europa em turnê com a Zémaria, me estendia por mais um mês extra, com gigs com o Monk Ponk e pensando mais e mais em passar mais tempo por lá.

Conheci a Teresa numa festa de amigos em Berlim em 2013, logo depois de me mudar para a cidade em definitivo. A gente combinou então uma jam session e começamos a nos encontrar nos fins de semana no Noisy Rooms em Friedrichshain. A ideia era só se divertir mesmo, mas nossas músicas começaram a tomar forma nos ensaios.

Chamei o Killian e o Anand (que tocavam com a gente) e a Teresa para uma sessão de gravação no meu home estúdio em Prenzlauer Berg. A coisa foi tão boa que a gente decidiu fazer shows em Berlim e o primeiro foi no ://aboutblank, com casa cheia. A partir daí, fomos dando mais atenção ao She Knows.

Teresa: Minha relação com a música eletrônica começou durante o curso universitário em 2004-05, quando estava estudando em Bremen. Naquela época, entre meus grupos favoritos estavam Ojos de Brujo, La Mala Rodriguez, mas minha relação com a música eletrônica era zero, e foi em Bremen que a descobri. Não era nada parecido com o que se ouvia na Espanha, nem com o que eu associava à música eletrônica... Eu adorei e abri minha mente para um novo mundo de possibilidades.

Cheguei em Berlim em 2009 e esses cinco anos até o nascimento do She Knows em 2014 marcaram minha jornada no projeto. Embora tenhamos começado como uma banda, eu não me conectava tanto com a proposta clássica de canção, parada, aplausos, canção, parada, aplausos. Eu me conecto mais com a dramaturgia de um set de DJ, na verdade, com um começo e um fim, sem interrupções.

Vocês nos disseram que o EP "Extraordinary" é especial porque vocês já sabiam que seriam as últimas gravações juntos no estúdio em Berlim. Podem falar melhor sobre isso? Por que o Marcel voltou para Vitória, no Brasil, e como isso tem impactado no She Knows?

Marcel: Eu fui pra Berlim pra ficar 6 meses e acabei ficando quase 10 anos. Teve uma hora que simplesmente bateu saudade de tudo e todos daqui. No meio disso, meu pai faleceu decorrente da Covid, e isso mexeu muito comigo. Eu não consegui ir ao enterro porque não dava pra viajar na época, foi bem difícil. Ao mesmo tempo, me mantenho muito conectado a Berlim. Vou ao menos uma vez por ano para gigs e gravações com o She Knows.

Teresa: Para mim, aquele último ano em que concebemos este EP também foi muito difícil. Eu sempre soube que o Marcel voltaria para o Brasil, mas é assim que a vida e as circunstâncias são. Marcel não foi apenas um parceiro artístico, mas também meu professor de produção musical. Sempre compartilhamos admiração e cumplicidade criativa, gosto do que ele produz e ele gosta do que eu produzo. Agora, precisamos nos adaptar às novas circunstâncias.

Eu já vinha apresentando She Knows desde 2019 em formato solo. Obviamente, quando temos a possibilidade de tocar juntos, a música cresce, porque são duas pessoas interagindo e criando, da mesma forma que cresce quando convidamos outros artistas para se apresentarem ao vivo, que contribuem com seu próprio toque naquele momento.

Ao mesmo tempo, a pandemia impulsionou bastante as tecnologias que tornam possível o trabalho à distância e há cada vez mais ferramentas que ajudam a colaborar a partir de diferentes espaços. Claro que isso terá um impacto nas produções, porque não vamos compor juntos, mas sim você agora, eu depois, você agora, eu depois... Mas talvez isso dê uma outra atmosfera, agora temos dois estúdios, um no Brasil e outro em Berlim.

E em relação à mensagem de paz, podem nos explicar melhor onde exatamente ela está dentro desse EP? Imagino que a inclusão de um remix de um artista ucraniano também tenha relação com isso, não?

Teresa: “Algumas coisas são dignas. Algo para salvar sim”

Para nós foi uma surpresa recente, soubemos no início do ano que The Organism seria o nosso remixer para a música "Something to Save", e não é que ele tenha dado outra mensagem à música, mas reforçou-a. Há sempre "Something to Save", especialmente o bom do que aparentemente pode ser percebido como mau.

Nossa responsabilidade como artistas é observar e expressar com nossos meios, no nosso caso a música. Enquanto o mundo é extraordinário e há tantas coisas que valem a pena, infelizmente a destruição e o enriquecimento à custa dos outros estão na natureza humana. E se enquanto alguns destroem, sem se importar com as vidas dos outros, movidos pelo poder e pelo narcisismo, outros têm que se levantar e dizer “Basta ya”, e apostar na paz e em todas as coisas que são dignas, inclusivas, tolerantes e, acima de tudo, para poder preservar os espaços onde as pessoas possam se expressar livremente.

Este, assim como a maior parte dos seus lançamentos, veio pela Bar 25. Como vocês ganharam a confiança de uma gravadora tão icônica da cena berlinense?

Marcel: A gente tem uma relação pessoal com o Bar 25. Eu tive o prazer de tocar lá em 2006, ainda com o Zémaria. E Teresa sempre esteve muito conectada à cena berlinense trabalhando e organizando festivais. Tudo aconteceu bem naturalmente então, acho que eles foram as únicas pessoas que enviamos a demo de Thalassa. E eles lançaram.

E sobre “Elements”, o que há de especial neste novo EP? Fale um pouco sobre os aspectos técnicos.

Teresa: A primeira vez que concebi a faixa "Elements" foi em 2020, durante minha participação no Musicboard Berlin Inland Residency. Com curadoria de Gudrun Gut, esse programa foi realizado na pitoresca Sternhagen Gut, em Uckermark, na Alemanha.

Estar no campo, concentrado em apenas uma coisa, foi uma jornada artística incrível para mim. Parecia que eu era um eremita, completamente imerso em minha música e cercado pela beleza inspiradora da natureza.

Cada passeio ao ar livre, cada chuva suave e cada brisa caprichosa se tornaram meus companheiros durante essas duas semanas. Os sons de fundo e as texturas cativantes da faixa foram criados usando amostras que foram gravadas lá.

Foi somente um ano depois que Marcel Dadalto se juntou ao projeto Ableton e começou a trabalhar do zero, acrescentando sua delicada abordagem musical à composição.

O que não prevíamos era o trabalho surpreendente que a gravadora fez para escolher Adrian Roman para os remixes. Ele realmente superou nossas expectativas e nos deixou maravilhados.

É impressionante como um remix pode transformar completamente o clima e, ao mesmo tempo, manter-se fiel ao espírito original da faixa. Somos imensamente gratos à Azzur por facilitar a conexão que tornou possível esse EP na forma como ele é apresentado.

A faixa "Elements" é um lembrete gentil para permanecer presente e saborear cada momento. Um lembrete de que tudo está em movimento, intenções, vibrações, ações, reações e mudanças são inevitáveis. Um lembrete para olhar para dentro e aceitar as coisas.

Quais são os outros artistas pelos quais vocês são influenciados e como vocês criaram seu próprio estilo?

Marcel: Nosso estilo saiu das jams que fazemos. A gente não conversa muito na hora de fazer música, só sai tocando, expressando aquele momento. Mas é óbvio que temos muitas influências musicais e não musicais também, e elas estão sempre mudando, se reciclando. Atualmente ouço muitas coisas da Underyourskin Records e Kindisch. Em casa, nos fins de semana, curto muito Reggae e Dub da década de 70.

Teresa, já que você é a cantora do projeto, conte-nos um pouco sobre como é viver em Berlim e como a cidade te inspira? Como está sua conexão com o Brasil?

Teresa: Lembro-me quando cheguei a Berlim, saía todas as semanas com minha primeira câmera reflex digital e passava o tempo todo tirando fotos, cada bairro tinha algo diferente a contar e tudo me inspirava, e até hoje me inspira.

As melhores festas eletrônicas são organizadas por coletivos artísticos, pois a curadoria artística não inclui apenas uma proposta musical, mas gira em torno de diferentes temas, decorações efêmeras, shows de luzes e fantasias, performances, cada coletivo é um mundo.

Atualmente, fazemos parte do artist roaster do coletivo Mystic Tales, que está deixando sua marca na cidade com suas festas “Mystic Creatures” e locais como Mensch Meier, Säälchen im Holzmarkt, Festsaal-Kreuzberg, Beate Uwe, etc.

De fato, foi meu trabalho como programadora cultural que proporcionou ao She Knows ter um palco constante e contínuo e apresentar o projeto para grandes públicos, o que é muito importante para um “Newcomer”.

Minha primeira relação com o Brasil foi através do Marcel. No ano em que sua filha nasceu, visitei-o e passei dois meses viajando pelo Rio de Janeiro, Vitória, Florianópolis, e praias paradisíacas.

Minha língua materna é o valenciano e é mais parecida com o português do que com o castelhano. Em dois meses, já entendia o idioma e falava "portunhol". E o que eu tenho que dizer é que são duas culturas regidas pelo sol, pelo bom tempo e pelo bom humor. Estou ansiosa para voltar e apresentar o projeto She Knows no Brasil.

Marcel, quais as principais diferenças que você enxerga nas cenas musicais para sua carreira no Brasil e na Alemanha, mais especificamente Berlim?

Marcel: Acho que na Alemanha há muitos investimentos em tecnologia e infraestrutura para criar experiências sonoras imersivas e únicas, e a arte no geral é mais valorizada e tratada como uma forma essencial de saúde e bem-estar da comunidade.

A cena musical em Berlim, assim como no Brasil, é muito diversa e com muitos estilos diferentes coexistindo e se influenciando mutuamente. O público é aberto ao novo, a novos formatos de apresentação e experimentações sonoras, o que cria um ambiente criativo e estimulante para os artistas e músicos.

Para shows fora da Europa, vocês conseguem trazer toda a estrutura de performances live, dançarinos e VJs? Como seria uma apresentação no Brasil? Está nos planos?

Marcel: A gente tem planos pro Brasil sim. Agora com nossa nova base/estúdio aqui, acho que está em boa hora de começarmos a expandir pros lados de cá.

Teresa: O fato de viver em Berlim como artista independente tem sido essencial para a existência do She Knows. Nosso projeto tem sido premiado várias vezes com fundos públicos daqui da Alemanha.

Atualmente, acabamos de receber uma ajuda da “Initiative Musik” para produzir nosso álbum de estreia, que será lançado no próximo ano de 2024, cortesia da estimada label Bar 25 Music. e já estamos nos estágios finais de produção.

Estamos muito felizes, pois isso nos dá certa independência na criação artística. Queremos planejar uma turnê no Brasil para apresentar o álbum e contaremos com dois formatos: electronic live act com drum machines & synths, e outro que incluirá Live Drums com a colaboração de Negoleo, que compartilha uma trajetória musical com Marcel através do Zémaria.

E quem sabe, eu adoro colaborar e incluir propostas pontuais nos shows, que naturalmente dependerão do local onde estivermos tocando, já que temos amigos artistas no Brasil.

Ouça 'Extraordinary' aqui!

Ouça 'Elements' aqui!

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Photos: Daniella Schadrin

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