Descubra como Royce Laroca transformou a Real Talks em um símbolo da cultura clubber na Irlanda
Conheça mais detalhes da história deste artista brasileiro nesta entrevista exclusiva
Desde 2019, Royce Laroca tem sido um dos principais articuladores da cena underground de Dublin, construindo pontes entre artistas, público e cultura clubber através da Real Talks.
O coletivo, que começou como uma plataforma para festas aqui no Brasil, lá em 2015, vem se consolidando como um dos pilares da música eletrônica na capital irlandesa, trazendo artistas de diversas partes do mundo e fortalecendo a cena local.
Mas sua história vai além da Irlanda. Com raízes no sul do Brasil, Royce iniciou sua carreira como DJ e teve sua estreia internacional em Detroit e desde então vem expandindo sua trajetória por palcos e festivais na Europa e nos Estados Unidos.
Seu estilo pode transitar entre House, Minimal, Techno, Acid e Breakbeat, sempre com uma curadoria cuidadosa e com uma forte conexão com o vinil, característica que se tornou marca registrada em suas apresentações.
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Agora, ele está a caminho de um novo passo em sua jornada com o lançamento da Real Talks Records, selo que chega para ampliar ainda mais a proposta do coletivo, levando seu gosto musical sofisticado para além das pistas.
Para falar sobre essa fase e os caminhos que percorreu até aqui, batemos um papo com ele:
Q+A: Royce Laroca
Olá, Royce. Obrigado por nos receber. Sua carreira começou no final de 2014 e, em 2015, você teve a oportunidade de estrear tocando em uma das cidades mais importantes na história da cena underground: Detroit. Queríamos que você voltasse um pouco no tempo e nos contasse como essa oportunidade aconteceu.
Olá Mixmag, é um prazer estar compartilhando um pouco da nossa história com vocês. Desde antes mesmo começar a tocar, viajava bastante para poder frequentar festas em diferentes cidades e estados, principalmente na Vibe, Warung, Terraza, D'Edge, além de festivais como Tribaltech, Universo Paralello em Pratigi, Festivals da D'Edge entre outros para ver artistas que não se apresentavam em minha cidade natal, muitas vezes não tocam com frequência no Brasil. Para mim era uma oportunidade de compartilhar aquele momento, ganhar inspirações e influências, me permitindo vivenciar e entender melhor esse universo que estava entrando.
Em 2015 decidimos dar passos maiores e ir para o Time Warp em Buenos Aires para ver nomes como Sven Vath, Ricardo Villalobos, entre outros. A experiência foi tão incrível e no mês seguinte decidi ir a Detroit para ir ao Movement Festival nos Estados Unidos, que por coincidência, tinha uma amiga estava morando em Detroit, a qual enviou um set meu para o venue chamado Northern Lights Lounge que ela costumava frequentar, que acabou fechando a minha primeira gig fora do país exatamente ao final do segundo dia do festival.
A noite foi muito especial, um dos highlights foi a reação das pessoas ao tocar The River from Matt John, música que trouxe todo mundo junto na pista a dançar, um momento mágico onde me senti conectado com as pessoas ali presentes. E para finalizar a noite em outro “after-party” onde estavam tocando Nina Kraviz e Robert Hood.
Nas semanas seguintes ainda fomos para duas cidades importante na história do Techno e da House music, primeiramente Chicago, onde tive a oportunidade de conhecer clubes como Spybar em Chicago, onde estava tocando Paco Osuna (https://ra.co/events/715490), e depois Nova York, visitando lojas de discos e indo na festa de celebração de 9 anos da festa Blkmarket Membership em Nova York que estava tocando masomenos e Makam (https://ra.co/events/703410), indicação de um DJ local chamado Zeni que trabalhava em uma das loja de discos chamada Halcyon Records, local onde comprei meus primeiros discos. Sem dúvidas essa viagem me influenciou.
No mesmo ano, em 2015, você criou a Real Talks. Consequentemente, sua carreira cresceu diretamente conectada ao coletivo. O que te motivou inicialmente a dar start nessa ideia aqui no Brasil? Você sentiu alguma carência na cena?
Sim, existia uma carência de eventos na cidade, aconteciam poucos eventos de música eletrônica e muitos dos poucos eventos de música eletrônica que aconteciam muitas vezes não nos identificamos com o estilo musical ou era mais do mesmo.
Antes mesmo de começar a promover eventos, por conta disso, tinha muita curiosidade e desejo de entender mais desse ecossistema, o que me fazia dirigir muitas vezes por horas como disse anteriormente, independente se era pra ver um big name ou uma festa de um coletivo independente, aprendendo vivenciando na pista, absorvendo o que podia para recriar essa experiência na minha cidade natal, na intenção de trazer mais dessa cultura mostrando que isso já acontecia em outros lugares a muito tempo, se conectando com pessoas que compartilham ideias semelhantes que gostavam desse tipo de música mais underground.
E quais foram os pontos que te fizeram decidir a continuar esse trabalho na Irlanda, em 2019? Como foi esse início por lá? Desconsiderando a pandemia que viria meses depois…
Acredito muito que quando estamos seguindo o caminho certo, as portas se abrem sozinhas…
Uma certa noite, estava em uma festa que costumava frequentar no clube chamado Yamamori Tengu daqui de Dublin, e fui convidado pelo promotor do evento para ir para o after em sua casa, que até o momento não sabia que eu tocava, muito menos com discos.
Chegando no after, quando vi que notei que ele apenas tinha toca-discos e um mixer mostrei que estava com alguns discos comigo, pois nesse mesmo dia eu tinha passado numa loja de discos no centro da cidade e comprei alguns discos novos e acabei não voltando para casa indo direto para a festa.
Uma coisa levou a outra e nessa mesma noite conversamos e fui convidado para fazer uma colaboração lá no Bad Bobs Rooftop, onde aconteceram os nossos dois primeiros eventos no rooftop ainda antes da Pandemia.
Depois disso veio a Pandemia, onde fizemos algumas gravações com o rooftop completamente vazio.
Sem dúvidas comandar esse coletivo te trouxe muitas coisas boas e oportunidades, incluindo se apresentar junto de grandes nomes da cena. É possível pontuar alguns dos encontros mais especiais que você teve ao longo da carreira até aqui?
Foram muitos, Francesco Del Garda, Harry McCanna, Barac, Keen, Kolter, Traumer, entre outros e cada um deles tem uma história que conta algo especial, como por exemplo, desde o início da minha carreira, sempre fui meio fascinado pelos discos coloridos da Eastenderz, label do East End Dubs, e ser convidado para abrir a noite para ele foi incrível e inesperado.
Mesma coisa com o mexicano Sakro, sempre gostei muito de suas músicas e ter a oportunidade não apenas de dar suporte, mas apresentar a cidade, trocar ideias, foram momentos marcantes.
Poderia pontuar a minha primeira apresentação no festival Otherside, tocando depois de grandes nomes como Chris Stussy, Oden & Fatzo, Rossi.
Rossi no Festival Otherside 2022
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Lembro de um after em casa com Rossi depois de umas das noites que tocamos juntos num clube chamado Bowlane Social Club, e como apenas tenho toca-discos em casa, ele estava tocando os meus discos e encontrou um dos seus discos favoritos na minha coleção, e sua reação foi algo inesquecível.
A noite com o alemão Ian Pooley, compartilhando não apenas uma aula musical, mas também grandes insights e conhecimentos que me levaram a refletir sobre carreira, produção musical e estúdio.
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Você tem um estilo versátil de discotecar, mas não dá pra negar que seu som é muito conectado ao House e ao Minimal, certo? Você acredita que ainda está em processo de construção de identidade? De onde vêm suas principais referências?
Correto, sempre estive muito ligado ao minimal e a house music. Mas independente disso, sempre procurava por música boa independente de rótulos, a grande maioria são discos de House a Minimal e sub vertentes, podendo encontrar de Dub Techno, Electro, música Ambient, Downtempo, Breakbeat… mas tenho discos de tudo, não apenas de música eletrônica, discos do Criolo, Sabotage, Mac Miller, Notorious Big, vários discos do Pink Floyd, de Nina Simone a Tim Maia, Milton Nascimento, alguns Mr. Bongo com músicas populares brasileiras, dos anos 70, 80, jazz, entre outros…
Acredito que a minha carreira é uma constante evolução e a minha identidade caminha de mãos dadas, e com as músicas que venho produzindo, acredito que isso vai ficar ainda mais nítido.
Inclusive, um dos diferenciais da sua carreira é a conexão mais profunda com o vinil. Sabemos que você tem uma história um tanto quanto curiosa sobre como essa relação com os discos começou…
Em 2015 na minha primeira gig em Detroit, quando cheguei e fui apresentado ao DJ que estava tocando, ele olhou para mim e para o booker e questionou onde estava meus discos, e meio que olhou para o booker com uma cara de desprezo e soltou um “are you serious?” Mas foi aquele momento um tanto curioso, mas mesmo assim pegou suas coisas e ficou ali do lado apenas observando eu me preparar e começar a tocar.
Ao final do set, o mesmo DJ veio veio falar comigo já com outra atitude, elogiou meu set e ficamos conversando por uns 20 minutos com ele me explicando porque eu deveria tocar com o discos e foi bem motivador, ao ponto de voltar para o Brasil voltei com um toca disco e alguns discos junto sem fazer ideia de como tocava. Pouco tempo depois tive aulas com o Kaka Franco, que foi uma pessoa que me influenciou ainda mais nessa minha conexão com o vinil.
Aproveitando e já falando do trabalho de estúdio… você até então não tinha dedicado tanta atenção à produção musical, possui poucos lançamentos, mas é algo que está mudando aos poucos, não é?
Sim, a produção sempre foi um universo que tinha muita curiosidade, mas dei um passo maior que as pernas, vinha pouco a pouco navegando esse universo, e aqui na Irlanda me dediquei a uma jornada de 3 anos fazendo faculdade de Audio Production & Music Project Management, que seria semelhante a um Bacharelado de em Engenharia de Áudio com Administração de projectos musicais, que envolve mais a parte de business da música, empreendedorismo, marketing… Dediquei esse tempo para explorar diferentes áreas, aprendi a usar ProTools, trabalha no estúdio, microfonar e gravar todo o processo de gravação de uma banda, tivemos projetos de pós-produção para filme, música para videogame, além da oportunidade de trabalhar em shows em festivais como o Electric Picnic ano passado.
2025 é o ano em que a gravadora será lançada, sendo uma das minhas motivações para dedicar mais tempo à música, revelando novos projetos como Ecyor que acaba de sair uma música na label brasileira Indica Label e o projeto CROÍ, que em Irish significa Heart / coração, com uma track junto com VA do primeiro disco colaborando com outros artistas.
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Agora começamos a escrever o próximo capítulo.
Inclusive, você comentou que irá lançar a Real Talks Records em breve, justamente lançando o primeiro VA em vinil. Por nos contar um pouco mais sobre a curadoria e como está sendo esse processo?
Real Talks Records é a nossa maior realização até o momento, pela nossa conexão com discos, estar entrando nessa nova jornada ampliando nossa forma de se comunicar e interagir com todo o esse ecossistema da música.
A curadoria vem da premissa de dar suporte para artistas que nos conectamos musicalmente e acreditamos ter um grande potencial no trabalho que vem fazendo. O primeiro disco conta com músicas de KAIR, HVSN, SAHM, CROÍ e do irlandês Lukey.
Por fim, além da gravadora, há alguma outra novidade ou plano em andamento que você gostaria de compartilhar? Obrigado!
Sobre a programação da gravadora, já recebemos todas as demos do segundo lançamento da Real Talks Records, um EP de uma artista e estamos já ansiosos para revelar mais detalhes.
Já a nossa programação de eventos para 2025, nosso próximo evento já está agendado, no dia 31 de maio recebemos o brasileiro Gromma para a nossa celebração de 10 anos de Real Talks Art.
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Imagens: Divulgação
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