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RENATO RATIER: saiba como a arte e a música ajudaram a formar um dos DJs mais versáteis da cena eletrônica mundial

Confira entrevista exclusiva com esse artista em constante evolução

  • Words: Marllon Gauche | Editorial Photos: Cassiano Vargas & Sarah Wormsbecker | Contribution & Review: Rodrigo Airaf
  • 10 February 2023

Renato Ratier, para muitos, dispensa apresentações. Mas se você é algum desavisado, aqui vai uma breve contextualização: nascido em São Paulo, mas criado em Campo Grande, Ratier foi um dos personagens responsáveis por revolucionar a cena eletrônica em meados dos anos 90.

No ano 2000, fundou o D-Edge em Campo Grande, logo depois expandido para São Paulo, em 2003, iniciando um movimento cultural clubber que perdura até os dias atuais.

Mais do que seu extenso tempo de carreira - já são 27 anos - Ratier possui outra característica muito única e especial: a gama de referências adquirida em toda sua vivência.

De b2bs intermináveis com centenas de artistas, como Solomun, que chegou a durar 12 horas, até outros sets icônicos na sua “caixa preta de som e luz”, ele se mostrou um DJ que vamos chamar aqui de camaleão, com o poder de adaptar-se e moldar-se a diferentes lugares e situações.

Foi assim que ele adquiriu uma visão aberta do mundo, imprimindo essa criatividade latente em todos os seus negócios: restaurantes, marcas de roupa, galerias de arte, festas, escola e agência de DJs, gravadoras e claro, aquilo que mais nos atrai: os clubs.

Isso inclui não só o D-Edge, como também o Tozen (que contaremos mais adiante) e o mais recente deles, Surreal Park, inaugurado em dezembro de 2021.

De agora em diante, então, você terá a oportunidade de conhecer Renato Ratier mais a fundo e adentrar em histórias que muitas pessoas nem sequer imaginam.

Renato, tudo bem? Vamos começar com uma pergunta curta, mas profunda. Quem é Renato Ratier?

O Renato Ratier é acima de tudo um sonhador, um cara movido por inspirações e que tem a arte na base de tudo.

Eu sou uma pessoa com um grande coração, apesar de que às vezes as pessoas que não me conhecem pensam: ‘Nossa, esse cara tem uma cara de marrento, brabo’, porque sou alto, né? 1,92… mas eu sou uma pessoa doce e amorosa - e sonhadora!

Vejo que puxei muito da minha mãe. Ela foi artista, atriz, tocava órgão, e eu acho que herdei muito dela esse amor pela arte em geral.

Um pouco antes de começarmos a entrevista você comentou que quando era criança já comprava discos de vinil, dos mais variados estilos; Punk, Breaks, música clássica… e hoje tens mais de 8 mil na coleção. Conte mais dessa história.

Então, na minha infância eu dormia escutando música já, tinha aqueles aparelhinhos antigos de fita e eu dormia com aquilo.

Em Campo Grande tinha uma loja que eu ia direto quando tinha uns 10 anos mais ou menos, chamava Roberto Som. Lá vendia todos os equipamentos, aqueles Gradiente, sabe? Aparelhos que tinham toca-discos, CDs, fitas, 3 em 1.

Na minha casa tinha uma parede com vários equipamentos de som, minha mãe também já tinha discos, aí eu ia lá na Roberto Som e comprava mais vinis… Rock anos 60, 70, Supertramp, The Cult, Duram Duram, Piano Bar, Michael Jackson, discos de Break… eu inclusive dava aula de Break pros meus amigos quando eu era criança, eu adorava dançar também, fazia até as funcionárias da casa dançar comigo… minha mãe ficava brava (risos).

Então a dança e a música fizeram parte da minha vida inteira, com certeza desde os meus 4 ou 5 anos. Acho que hoje minha coleção gira em torno de uns dois mil CDs e uns oito mil discos de vinil.

E como era a tua vivência com a música antes dela virar business? O que escutava? Quais lugares você saía na adolescência?

Sou de 1972, e essa década foi muito forte na Disco, logo depois veio os anos 80 com New Order, Depeche Mode, etc., foi quando começou a nascer a Dance Music por aqui e eu comecei a ir nas matinês.

A minha geração teve um contato com a Dance Music de pista muito maior do que a geração de hoje. Eu andava muito de roller naquela época (ganhei até um campeonato porque eu toda tarde ia para a pista) e era só Disco/House que tocava lá.

Tinham discotecas que eram de matinês, como a Chattanooga, então, na verdade, era pra eu ter virado DJ muito mais cedo.

Mas eu viajava com meus pais pra Europa e eu trazia discos pros donos da Chatanooga de presente, porque eu era amigo deles, então eu dava uns 10-15 discos sempre.

Nessa época eu tinha uns 16 anos, então foi uma “escola” pra mim. Depois eles abriram um outro clube chamado Mr. Dan, e acabou que foi nessa época que eu comecei a fazer as festas em Campo Grande, em 96, aí o Chatanooga durou mais um tempo (até 99) e depois acabou.

Mas eles fizeram um trabalho ótimo por lá. Então, resumindo, minha vida inteira convivi com música, de diversos estilos, da Clássica ao Punk Rock, Disco, House, Jazz, Funky…

E aí a sua família não cobrava o que você já ia fazer da vida nessa época? Faculdade e etc.?

Cobrava, claro. Minha família trabalha no agronegócio, sempre trabalhou. Em 1991 eu fui fazer Zootecnia, fiz um ano e pouco, quase dois anos, larguei e fui fazer Direito no Rio, larguei também.

Aí voltei para Campo Grande, meu pai me deu uma fazenda e falou: ‘vai tocar dos seus negócios’, eu tinha uns 20 anos. Aí eu ia para a fazenda e tal, mas a música sempre esteve presente.

Com 20 anos já fazia festa em Campo Grande, só não eram tão profissionais ainda. Aí, nessa época, como eu ainda era muito novo, decidi morar fora.

Queria morar em Amsterdam porque eu gostava muito de lá, mas meu pai não deixou, falou: ‘Não! Amsterdam é uma cidade perigosa’, acabei indo para Los Angeles, morei dois anos e pouco, fiz curso de Design de Interiores e lá eu saía direto… Nova York, e tal, então essa cultura de clubes começou muito cedo e eu viajava muito sozinho, às vezes ia pra Europa… e como eu estudava à tarde, eu saía direto, 5-6 dias por semana (risos).

Então isso foi muito importante pra minha formação, e foi nessa época que eu comecei a me interessar pela discotecagem.

Aí eu voltei dos Estados Unidos no final de 1995 e comprei meus toca-discos, mixer, etc., e instalei na biblioteca da casa do meu pai.

Nessa fase eu coloria o cabelo, tive de tudo quanto é cor que você imagina… e aí meu pai pensava: ‘Meu Deus…’, eu andando em Campo Grande de Cadillac antigo, 66, cabelo colorido, música eletrônica… os amigos do meu pai falavam: ‘o fi do Zé é louco, né?’ (risos).

Quando eu compartilhava a ideia de fazer festa na cidade, as pessoas falavam: ‘O que você quer com isso aqui? Isso não existe, aqui é Campo Grande…’, e no fim nós fizemos as maiores festas do Brasil.

Em 1997, teve uma chamada Organic, dentro da estação ferroviária, que foi a maior do Brasil naquele ano, 10 mil pessoas escutando House e Techno, só no ano seguinte que a XXXPerience fez uma edição maior que a nossa.

Nessa época, em 1995, Renato Ratier também já comandava algumas marcas de roupas como Vallet e Tilt; seu primeiro ‘negócio’ físico foi uma loja chamada Subculture, onde as pessoas podiam comprar as roupas para curtir o rolê e também os ingressos para os eventos… era o “início da revolução”.

A revolução de Campo Grande

Então foi aí que a coisa começou a ganhar volume, né? Depois dos sucesso dessas festas…

Exato. Quando eu voltei para Campo Grande, eu pensava: ‘Cara, eu quero revolucionar essa cidade. Como eu posso fazer isso?’, e aí eu entendi que não seria apenas com música. Foi então que eu comecei a criar uma comunidade pras pessoas estarem imersas nessa cultura dos anos 90.

Então eu montei uma loja com uma marca, onde as pessoas podiam comprar as roupas para ir nas festas e também os ingressos, um programa de rádio, o Tecnovallet, e até fiz uma revista junto com um amigo meu publicitário, chamada Refmag, era uma revista pocket onde falávamos várias coisas…

Depois eu criei uma revistinha do D-Edge chamada Entretendo Mentes, uma brincadeira com entertainment, ali a gente falava de cultura dos anos 70, moda, todo esse movimento atual e da economia criativa, falava de artistas, entrevistas com DJs…

Tudo se conectou como uma teia e a cidade se tornou um dos polos mais importante de música eletrônica do Brasil, uma cidade que não existia cultura nenhuma começou a ser referência. O D-Edge foi capa da Frame e de várias outras revistas renomadas mundialmente, isso eu tô falando num clube dos anos 2000 no interior do Brasil… revolucionou! Esse lifestyle foi implantado na cidade.

Outra curiosidade é que Renato Ratier também foi o primeiro artista do casting da Hypno, a primeira agência de DJs do Brasil, fundada em 1996.

O início do D-Edge em São Paulo

É verdade que quando vocês inauguraram em São Paulo, em 2003, o D-Edge já começou abrindo todos os dias?

Sim, abria de segunda a segunda, em 2003 abríamos sete vezes por semana, ficamos por muitos anos assim, é indescritível.

Acho que não tem nenhum clube na história da América do Sul — talvez mundial — que tenha tantas aberturas quanto nós tivemos.

Fomos o primeiro club do mundo a usar LED, Tuboled e linhas de luz, e eu falo isso com muita gratidão às pessoas que estavam comigo, como o Muti Randolph, um cara sensacional, fora da curva, um dos designers mais talentosos do mundo, que foi fundamental no projeto.

E aí a programação era: segunda-feira São Paulo On The Rocks; terça-feira Techno com a galera da Circuito, com o André Barcinski; quarta-feira era anos 80 com a Glaucia; quinta-feira a Upgrade, que era uma festa de Progressive House; sexta-feira Freak Chic, onde eu era residente… então isso é até importante destacar: minha residência inicial foi de House, minha base veio da Disco e do House.

Só depois que fui abrindo pro Techno, Electro, Minimal e outros… mas chegou num momento da minha vida que eu falei: ‘não quero mais ser residente de noite nenhuma, porque eu quero tocar de tudo, fazer set de Rock, anos 80 e anos 90, House — que é a minha essência — de Techno, de Disco…’, aí não quis mais residência pra não ser mais estigmatizado em um único estilo.

O surgimento do Tozen

O D-Edge de Campo Grande existiu por cinco anos, certo? De 2000 a 2005, mas logo depois você já deu start em um outro club, o Tozen. Como foi isso?

Exato, abriu um hospital na frente do D-Edge, aí eu tive que encerrar as atividades e abri o Tozen, que tinha uma proposta totalmente diferente.

O D-Edge era uma caixa fechada, colorida, né? Aí eu pensei: ‘vou mudar, vou para um parque, o Acrissul (Associação dos criadores de Mato Grosso do Sul)’, e o Tozen surgiu inspirado na cultura oriental, uma mistura de Tailândia com China, com teto de capim… e o nome foi uma referência mesmo para “estou zen”.

Tinha uma pista aberta, eu mudei aquele negócio caixa fechada, queria levar a galera pra outra experiência. Aproveitei e montei um restaurante tailandês lá dentro, foi o meu primeiro restaurante, em 2005, e aí tocou Laurent Garnier, Kevin Saunderson, e muitos outros…

E aí pegando esse gancho de novos clubs, de estar sempre inovando, você sente que hoje está no auge da carreira profissional?

Eu gosto de pensar que ainda não cheguei na melhor fase da minha vida, afinal, a gente está sempre evoluindo, né? Esse é o propósito da vida.

Acredito que eu ainda posso colaborar de diversas maneiras, trazendo música boa para as pessoas como DJ e também através de novos empreendimentos.

Eu sou grato a todo o passado, eu olho pra trás com muito orgulho e gratidão por todas as pessoas que me ajudaram, mesmo aquelas que não estão comigo hoje, e mesmo as que não foram leais, porque elas me tornaram uma pessoa melhor!

D-Edge Campo Grande, D-Edge São Paulo, D-Edge Rio, Tozen, Holzmarkt (Berlim), Sociedade no Warung, Surreal Park, dois restaurantes, três marcas de roupas… Tudo o que eu criei não é um acúmulo de coisas, é um acúmulo de experiências, de vivências, o que eu vou levar daqui é o que eu fiz, o que eu plantei, as coisas boas que eu deixei, as boas lembranças, o legado… tudo isso me motiva muito.

Faço 51 anos agora (17 de fevereiro) e vou estar ativamente, dando toda minha energia se Deus quiser, Ele que está no comando de tudo, é Ele que decide, mas eu vou fazer minha parte e quero estar no mínimo mais 10-15 anos ativo fazendo as coisas acontecerem!

Agora voltando a falar um pouco mais sobre o D-Edge e suas ramificações, eu gostaria de saber sobre as gravadoras, a D-Edge Records, D-Edge Black e Olga. Como está isso? Quem comanda? E as suas produções autorais? Alguma ideia de quantos trabalhos lançados você tem?

Todos os lançamentos dos selos são aprovados por mim, mas quem coordena é o André Torquato. Sempre está rolando muito trabalho por trás de cada gravadora.

O André recebe demos, dá uma filtrada e compartilha comigo quando acha algo interessante, eu escuto e decidimos por onde vamos lançar. Hoje a D-Edge Records tem quase 50 lançamentos, além de outros 10 da D-Edge Records Black e mais 12 da Olga.

O André também me auxilia em algumas produções minhas. Então eu tenho as ideias, compartilho com ele e trabalhamos em cima… inclusive tenho muita música finalizada pronta pra lançar.

Sinto orgulho da minha discografia. Tenho dois álbuns oficiais, Youniverse e o Black Belt — este último rendeu outros dois álbuns de remixes — e entre singles e EPs, são cerca de 20 só pela D-Edge Records e outras 30 por diversos selos, incluindo parcerias com Stimming, Gui Boratto, Roland Clark, remix pra Rita Lee, Arnaldo Baptista, entre outros muito especiais.

E novidades? Tem como dar um spoiler do seu próximo lançamento?

Claro! Em breve tá chegando meu próximo álbum, Organic Synthetic, ele já tá engatilhado pra sair em março ou abril… usamos bastante coisa que eu já tinha gravado no meu gravador durante umas viagens que eu fiz pela Amazônia, no Safari da África, então foi bem essa mistura de sons orgânicos com sintetizadores. Queremos até fazer umas cópias de vinil, quem sabe…

O grupo do D-Edge está aberto para receber e ouvir o seu trabalho. Envie suas demos para: [email protected]

Algumas produções icônicas de Renato Ratier

Renato Ratier Non Stop — “Chega, meu filho!”

Existe uma história que até sua mãe tentou te fazer parar de tocar um dia…

Sim! Antes era um problema me tirar da cabine, todo mundo sabe, os velhos contratantes principalmente… (risos), aí essa história aconteceu uma vez lá no D-Edge.

Primeiro ela ligou pra minha casa e alguém avisou que eu ainda não tinha chego, aí ela ligou no D-Edge e falou com a gerente, que avisou que eu estava tocando, aí a gerente foi até mim, me chamou na cabine e falou: ‘Ó, sua mãe tá ligando, falou que você tem que terminar…

Aí passou um tempo e ela ligou de novo pra falar comigo, aí eu abaixei na cabine, diminui todo o retorno e ouvi ela falando: ‘Meu filho, pelo amor de Deus, já chega… o pessoal tem que trabalhar hoje a noite de novo, eles não vão nem dormir…’ (risos).

Hoje eu já não faria mais isso, claro. Mas recordar é viver, foram muitas histórias boas.

Então você sempre tenta ficar com a família mais tempo hoje, né?

É, cara, eu sei que a minha vida não é só minha, é dos meus filhos também, da minha mãe, então eu não quero deixar de levar algo bom para as pessoas, tanto para os mais próximos quanto para o público.

Nunca foi pensando só em mim ou nos negócios, mas também sempre no próximo, nos colaboradores, etc. É muito difícil fazer um planejamento exato na minha vida, porque eu não tenho rotina, eu não tenho só uma casa, eu tenho em São Paulo, Campo Grande, Rio de Janeiro, e ainda tem as gigs, então procuro sempre equilibrar e ir sentindo: ‘Pera aí, tá faltando dar mais atenção para os meus filhos… para! Essa reunião que era hoje não vai acontecer, vai para amanhã, hoje eu vou ficar com meu filho’.

Se eu estou viajando demais e não tô dando atenção para minha mãe, eu paro e falo: ‘Mãe, tô indo pra aí, vamos viajar? Ficar uns dias na fazenda juntos?’, aí eu pergunto pra equipe: ‘Tem alguma coisa na minha agenda hoje? Se tem e tiver como adiar, passa pra frente’.

Então assim, se eu tô trabalhando demais, preciso dar um break, tirar alguns dias, dar atenção pras pessoas que são próximas a mim.

Depois que eu terminei o Festival do Surreal, eu tinha mil coisas pra resolver, mas eu falei: ‘Quero fazer um safari na África’, por quê? Porque eu precisava daquele tempo com a minha namorada, relaxar, porque se eu virar dependente de DJ, dos clubes, dos meus negócios, uma hora eu não vou aguentar mais… pra mim não existe sexta, sábado, domingo… eu tô trabalhando sempre, 24/7, meu telefone não para, então eu procuro sempre sentir e buscar o equilíbrio, eu vou sentindo, em todas as áreas da minha vida.

E o D-Edge segue em expansão — a reabertura no Rio está próxima

Legal ouvir isso. Mas os trabalhos não param, né? Outra novidade é o D-Edge Rio, soube que o projeto é enorme e está em fase final, já com previsão de inauguração…

Sim, finalmente! O projeto é de seis andares, totalizando 2.600 metros² de área construída, vai ter galeria de arte, restaurante, livraria, uma loja multidisciplinar que vai vender coisas da Ratier Clothing e outras marcas, até mobiliário.

No terceiro andar vai ter uma pista menor, pra cerca de 300 pessoas, o quarto andar vai ser a pista principal, com capacidade pra 900, além de mais um terraço com fumódromo na parte de cima, com bar e um skyview pra Baía de Guanabara.

Então, por conta disso tudo, ele não é apenas o D-Edge Rio, mas sim o CCDR, Centro Cultural D-Edge Rio. Terminamos toda a parte civil e de infraestrutura agora, estamos nos acabamentos finais e no detalhamento. Provavelmente inaugura em abril, que foi o mês de abertura em Campo Grande e São Paulo.

E como você busca a excelência em todas as frentes que você atua, e ainda por cima mantém a carreira de DJ em alto nível?

Eu me considero um DJ coringa, gosto de dizer que sou a carta que vai entrar em qualquer jogo do baralho. Sou versátil.

Se precisar, o Renato Ratier vai tocar Afro House, Techno, Disco, Electro, Minimal, Deep, Breaks, Tech House… só nessas últimas semanas eu fiz vários b2bs com Loco Dice (House/Tech House), Mind Against (Melodic Techno), ANOTR (House)...

Você pode até saber como vou começar meus sets, mas nunca vai saber como vou terminar, porque eu não quero ser um DJ óbvio. Uma indicação que eu sempre faço é um set meu de 13 horas que eu gravei depois do Nicolas Jaar, no D-Edge, foi em dezembro de 2011 em uma Freak Chic… essa semana foi muito doida!

Quarta-feira teve Hot Chip e um outro gringo, era uma festa da Nokia, foi até 7-8 horas da manhã, foi muito especial. Na quinta teve o Martin Buttrich, ele faz Live, geralmente de duas horas, mas lá ele fez de 7 horas.

Eu toquei depois, saí do D-Edge cansado demais… na sexta teve Nicolas Jaar, eu abri pra ele, ele tocou e depois toquei mais 13 horas…e depois eu ainda fui para XXXPerience, onde eu acabei fechando a pista, encerrando no meio dia. Então toquei quarta, quinta, sexta e sábado, foi louco.

E voltando a pergunta sobre a carreira de DJ, eu tenho a seguinte visão: o cara que se dedica pra alcançar um objetivo grande, ele se esforça até conseguir realizar, mas fica focado apenas naquela coisa, ele se torna um ‘especialista’, digamos assim.

Mas pra mim, quem quer ser DJ de verdade, precisa ter uma visão mais ampla, ele não pode só olhar em uma direção… então, DJ na minha concepção, é igual falou o Lulu Santos, uma espécie de sommelier, que sabe o que é bom e pra qual ocasião serve.

Você precisa entender todo o contexto, ter muita bagagem, influências de outras épocas, de outras áreas, só assim pra conseguir entregar a música certa no momento certo.

Então eu sou assim, eu bebo de várias fontes, me sinto como uma esponja, como um camaleão, que absorve um pouco de tudo, e é isso que dá a experiência que você não encontra em nenhum outro lugar.

Então eu não consigo me dedicar só a uma coisa, mas cada coisa que eu faço dou o meu máximo e isso reflete no meu trabalho como DJ, sem dúvidas.

“Eu não quero ser um DJ óbvio. Sou como um camaleão”

Aproveitando essa boa analogia de ser um DJ camaleão: muita gente te rotula como um DJ de Techno, mas a gente sabe que sua base principal é justamente o House, como você comentou antes da sua primeira residência… mas e a sua pesquisa/preparação pras gigs? Como você se mantém atualizado hoje?

Realmente não tenho muito tempo, são muitos afazeres. Mas ao longo dos anos eu consegui criar uma coleção bem vasta de música, porém, como hoje eu não tenho mais tanto tempo para pesquisar todas as novidades que estão saindo nas lojas, eu tive uma ideia: ‘por que não olhar pro meu passado com tantos discos e CDs que eu tenho?’, foi aí que comecei a resgatar meus vinis, tanto que na quinta-feira no D-Edge com o Loco Dice eu toquei vinil.

Hoje não toco mais tanto com vinil por causa do meu problema na coluna, aí dificultou um pouco, mas então eu pensei: ‘em vez de eu tocar tudo que tá lançando de música nova, que tem um monte de gente que vai tocar porque tá nas plataformas e é o mesmo acesso pra todo mundo, prefiro tocar coisas do meu acervo de 25 anos para trás’, porque tem um monte de coisa boa.

Mas claro, quando sobra um tempo eu entro e pesquiso alguns selos que eu gosto, baixo… e outra, eu tenho todos os sets feitos no D-Edge gravados, então se algum artista fez um set bom, eu vou lá e escuto esse set de novo pra fazer a pesquisa dessa forma também.

E você tem algum selo favorito?

Pô, aí você fez uma pergunta difícil, eu sou um cara que não consegue ter favoritos… porque como eu falei, eu sou camaleônico, então se você perguntar pro camaleão a cor que ele prefere quando muda, não tem, sabe? (risos).

Tem muitos selos de amigos e grandes artistas que eu poderia citar, mas pra não ficar chato e responder só um mesmo, ficaria com o Classic Music Company. Ele era do Luke Solomon, um inglês, e do Derrick Carter, de Chicago, então tinha essa mistura do House Londrino com o House de Chicago, essa gravadora virou um braço da Defected. Eu diria que eu tenho quase todos os discos dela e, claro, o Derrick Carter também é um dos meus DJs preferidos.

E agora que já falamos de D-Edge, gravadoras, DJs, vamos falar um pouco de Surreal. Eu queria saber qual foi o estalo que te fez criar esse espaço, o que te inspirou?

Bom, eu era sócio do Warung, fiquei 11 anos nessa posição, e realmente o Warung ganhou uma energia muito forte ao longo desse tempo, eu entrei com a faca nos dentes e eu acho que fiz uma ótima entrega, fico feliz com todo o meu trabalho por lá, eu evolui muito com o Warung, assim como eles colheram muitos frutos comigo também... mas chegou naquele momento em que eu senti que minha missão estava cumprida.

Aí, enfim, o mesmo corretor que me vendeu essa casa onde estamos, falou que ia achar outro lugar, disse que a região estava precisando de um outro club e tal, aquela coisa, e aí eu fui lá ver esse lugar, que era onde eu já tinha tocado uma vez, na festa da Seas Label.

Só que cara, essa festa que toquei era de noite, a parte que vai pro lago tava fechada, tinha um tapume, então eu não vi quase nada, deu 5h da manhã eu já tava indo embora. Aí quando eu fui visitar de dia com o lugar todo aberto, eu olhei e falei: ‘Vai tomar no **, olha esse lugar, que energia boa’, eu fiquei impressionado! Aquele campo verde enorme… aí eu olhei e já falei: ‘vou fazer aqui!’.

A inspiração já veio na cabeça junto na hora. Eu estava assistindo Peaky Blinders e pensei: ‘esse galpão que tem tudo a ver, tem cavalo, tem uma igreja…’ já veio na cabeça, Bells, Nomad, questão cigana, na beira do lago… Raw Room que era a casinha que eu fazia circuitos pelo Brasil, tudo se conversou!

E além de DJ e dono de clube, eu me considero um bom diretor de arte, e dessa experiência de ter me formado em Design de Interiores, ter conhecido tanta coisa, viajado bastante e tal, então eu cheguei e a inspiração já veio na hora!

Irado, é um lugar que já ganhou a galera… Então, por fim, outra palavra que às vezes se ouve relacionar com sua trajetória é "legado". Conte-nos uma coisa apenas, que você considera a mais importante de todas, para a construção do seu legado.

Constância e persistência. Nem sempre vai ser no primeiro momento que as coisas vão dar certo.

Constância, persistência, persistência, constância, persistência, consistência, persistência… você chega onde você quer chegar.

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