Papo sério com Vini Pistori: alta produtividade do DJ e efemeridade musical no século XXI
Artista levantou reflexões sobre competição e conteúdos descartáveis
Tudo que é novo hoje, será obsoleto amanhã. Isso vale para músicas, tendências, memes, filmes, séries e conteúdos em geral. No urge da novidade e do instantâneo, perdemos a capacidade de nos mantermos atualizados.
E este fluxo contínuo ditado pela sociedade pós-moderna, como explicado pelo sociólogo Zygmunt Bauman, são os “tempos líquidos”, no qual nem temos a chance de absorver todas as informações e mudanças que chegam até nós.
Falando especificamente do universo musical, um som pode ser considerado um clássico e ser descartado da mesma maneira no dia seguinte. Para tratar desse assunto sério, trouxemos a participação do DJ e produtor Vini Pistori, que revelou seu ponto de vista acerca da efemeridade musical:
“Nos tempos em que vivemos tudo é muito imediato, as pessoas andam muito ansiosas por novidades, por tudo rs, e até muitos produtores trabalham ansiosamente em sempre surpreender, seja os ouvintes, ou as gravadoras almejadas, para ter sua música lançada ali.
Que temos muita música hoje em dia é inegável, mas acredito que sempre tem aquelas que fazem parte da história de um artista, que não só ele gosta, mas que funciona muito bem na pista de dança, ou em sua vida pra ouvir em algum momento, não necessariamente uma música de pista.
Na minha opinião, o "descartável" é um ponto de vista, para alguns a busca incessante pelo novo faz tudo parecer descartável, mas o que tem identidade é único, se destaca e não se descarta tão facilmente”.
Todos os dias, mais de 40 mil músicas são atualizadas no Spotify, falando de apenas uma plataforma de streaming disponível. E aquela sensação de que já se ouviu uma música antes se torna recorrente. Se nada se cria e tudo se copia, fica difícil separar a originalidade dos padrões exaustivos. Nesta enxurrada de “novidades”, algo verdadeiramente novo e único consegue prosperar? Vini Pistori também abordou esse ângulo da questão:
“Acredito que sim, o novo traz algo diferente, verdadeiro, por mais que tenha algum elemento que já foi usado em outra música, uma ideia ou um arranjo similar, aquilo foi feito de forma realmente "nova" e isso se destaca. Acho que o descartável é realmente aquilo que não foi feito com o coração, com identidade, foi intencionalmente "copiado".
Um exemplo bom sobre nada se cria e tudo se copia, é o famoso uso dos samples, inclusive muito da House Music e Disco surgiu a partir disso, e tem muita coisa atual até hoje que não se tornou descartável.
Acho que o segredo de não cair no descartável é ser feito realmente com o coração, o que naturalmente terá uma identidade única, e também lançado por uma gravadora relevante, que ousa em lançar o diferente, que se tornará novo e não simplesmente lançar por lançar em qualquer plataforma”.
A busca pelo prazer incessante e a superficialidade das produções regem o status atual das coisas, reduzindo nossa experiência humana para algo que consumimos e tem que ser pra ontem. Tudo que é bom, leva um certo tempo de maturação, sejam as ideias e os conceitos.
A globalização e suas tecnologias, facilitaram a interação mundial, com mais pessoas sendo capazes de produzir e mais pessoas sendo capazes de consumir.
Apesar de parecer fatal, este cenário também abre a possibilidade de expansão e conexão com diferentes públicos e dá chance para novos artistas saírem do anonimato. Vendo por esse lado, Vini Pistori comentou:
“O lado bom da acessibilidade é isso, todos podem fazer, todos podem mostrar, mas somente aqueles que fazem de verdade alcançarão um lugar. Pode levar algum tempo, como você mesmo disse, é necessário maturar, no público, no mercado em que se está inserido, mas será reconhecido.
E entrando nesse assunto, podemos cair em um "looping", pois sem constância, sem ser visto, é difícil encontrar seu espaço. Então muitas músicas ainda serão lançadas por diversos artistas que se espelham naqueles que alcançaram algum objetivo similar ou até mesmo o mesmo objetivo desejado.
O segredo está nisso, em não fazer a mesma coisa que o outro fez só pra conseguir seu espaço, ao meu ver é aí que surgem cada vez mais músicas descartáveis, pois são "cópias" para tentar ter o mesmo resultado. Como sempre falo, cada um tem um RG, cada indivíduo é único, então basta explorar a sua essência e olhar pra você e retirar aquilo que só você tem. Dificilmente será igual ou repetido. Nem gêmeos produzem os mesmos resultados.
O segredo é ter paciência e não ter um pensamento descartável. Acho que vale a reflexão de você vencer a si mesmo, porque sem isso, não poderá vencer ninguém. E não é sobre competição, é sobre conhecimento”.
A música por si só, exibe infinitas possibilidades de criação e nenhuma cultura está restrita e presa em seu próprio ciclo. As interações humanas sempre levarão à criação de novos modelos e jeitos de se fazer algo. Por isso, ouvidos atentos e bom senso ligado para não cair numa bolha e perder toda a diversidade que existe ao nosso redor, filtrando por aquilo que realmente nos interessa.
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Photos: Divulgação